Há dias penso se escrevo ou não esta minha história. Mas é uma via praticamente inevitável, sendo que minha forma de lidar com a tristeza ocorre de duas maneiras, a primeira que é limpando e organizando as coisas depois de ter chorado muito e a segunda é escrever sobre e assim organizar as ideias e os sentimentos (muitas vezes em meio a muitas lágrimas). Escrever não significa redigir um textão aqui no blog, o ato de escrever para entender meu sentimento pode ser contar por email pra um amigo o que passei, o que senti e o que sinto. Colocar as palavras no monitor, vê-las se formando sílaba a sílaba e reler me ajuda a enxergar o que tô sentindo.
A limpeza e organização funciona como se eu me livrasse da parte ruim da tristeza, é o ato físico de jogar fora a dor, a mágoa, a angústia e a culpa daquela melancolia. Fazer o exercício de mover os móveis de lugar e jogar fora o que não serve mais é muito mais que simbólico, ele me ajuda a me libertar daquela sensação negativa que me pesa. Principalmente porque a minha faxina sempre tem que ter música e quando tem música tem dança e cantoria. E já diz o ditado "quem canta seus males espanta".
A escrita também é parte da organização. Ela ajuda a organizar as ideias, como já disse e me faz perceber o que não serve e como posso agir a partir daquela tristeza.
Desta vez eu não pude fazer a limpeza física, do ambiente, talvez por isso vez ou outra o nó aperte na garganta. Então preciso o quanto antes recorrer a escrita para mandar embora as últimas sensações e medos que ainda restam.
Em menos de um mês eu fui da felicidade extrema a uma tristeza muito doída! Descobri em 6 de julho que estava grávida num teste de farmácia, contei ao meu companheiro, que há muito já estava desconfiado, no dia seguinte fiz um exame de sangue, que confundiu minhas ideias porque eu não sabia ler o resultado, mas no sábado confirmei a gravidez. Não foi planejada, mas foi muito desejada! No final do ano eu deixei de tomar o anticoncepcional. Primeiro sem contar a ninguém, mas depois resolvi que meu companheiro deveria participar da decisão, no que ele me apoiou, inclusive dizendo que ia mesmo me sugerir parar. Sendo assim, ambos sabíamos que poderia ocorrer uma gravidez. Eu, tendo visto relatos de mulheres que levaram de um ano a mais para engravidar após a parada acreditei que comigo também iria demorar. A notícia foi recebida com muita alegria por todos.
Tão logo fiquei sabendo, virginiana que sou, fui logo procurar meu médico para saber se estava fisicamente bem para a gestação. Fiquei pensando que estando com hipotireoidismo e tendo que tomar remédio para controlar o melhor era constatar se estava tudo bem. Na semana seguinte fui ao médico, que solicitou um ultrassom para saber quantas semanas o embrião teria e como estava se desenvolvendo. Pediu urgência! Ah! Esqueci de contar que estou com 39 anos, aquela idade que as pessoas ao mesmo tempo que incentivam dizendo que és jovem e podes ter uma gravidez tranquila te lembram que pode ter riscos, já que é a primeira. Então corri para o primeiro ultrassom.
Em 12 de julho fui lá para fazer o exame e saber como as coisas iam. Minha primeira pulga atrás da orelha. O médico que fez o exame não disse diretamente, mas disse que naquele tempo estimado as coisas deveriam estar mais adiantadas, deveríamos escutar o coração do bebê e ele estaria mais ativo. Meu mundo balançou e meu coração ficou numa angústia permanente até o próximo ultrassom, sugerido para daqui dez dias.
Neste tempo eu rezei muito! Fui ao meu médico que tentou tirar da minha mente a ideia de um bebê morto no meu ventre, mas enfim, ao mesmo tempo ele já me alertou que caso isso tivesse acontecido eu teria que fazer uma curetagem e tal. Saí com o mundo um pouco mais sacudido e tentando sorrir tirando a angústia do meu coração. Nunca o tempo passou tão devagar! Eu marquei o exame que deu um pouco mais de 10 dias e em primeiro de agosto lá fui eu para o ultrassom. E as coisas estavam iguais ao primeiro! Mesmo tamanho, sem batimentos e com um pequeno sangramento há três dias. A médica foi super atenciosa, um amor comigo, me explicou com a maior calma e compaixão do mundo que o feto estava morto e eu precisava retirar o saco gestacional através de um procedimento com meu médico ou procurando o PS.
Eu chorei! E rezei pra não ficar triste demais, nem ficar me sentindo culpada, nem pensar que eu não vou poder tentar de novo, nem que eu tivesse alguma mágoa ao ver outras mulheres grávidas neste momento. Meu maior medo foi ficar com mágoa, porque eu sei que estas coisas são parte de um grande aprendizado. Mas a gente é humano e falho e pode sentir coisas assim.
Então contei pro meu namorido o que aconteceu e não consegui não chorar. E contei pra família e me preparei psicologicamente para ir ao PS fazer a curetagem. Aliás tive medo da dor! No pronto socorro foi rápido, logo me passaram para a ginecologia, aqui demorou um pouco. Fiz o relato do caso, levei os exames, examina um residente, examina o médico e então eles me falam que tenho que ficar no hospital porque o procedimento é feito só no dia seguinte. Foram também muito atenciosos me falando com empatia tudo que seria feito e como. Faz a baixa, exames, coloca acesso e espera até a hora de colocar os compridos para provocar a abertura do colo do útero. Pensei, meu Deus me ajude, dizem que a dor é horrível. É mesmo, mas não mais que a dor da perda.
No mesmo quarto que eu duas moças com menos de 30 na mesma situação, mas com as gestações mais avançadas, bebês mais desenvolvidos. Já sabiam o sexo, já tinham escolhido os nomes. Neste momento me senti menos sofredora. Tinha ganho alguns presentinhos, já tinha pensado nos nomes possíveis, mas não tinha escutado o coração! Não tinha sentido vivo aquele ser que eu amava! Era uma semente germinando. Mas elas tinhas caminhado um pouco mais, já tinham enxoval, planejavam o quarto, chá. Senti uma grande tristeza pensando o quanto a dor era maior pra elas. O nó apertou na garganta! Segurei o choro! Fomos companheiras a noite toda, nossas cólicas aconteciam em intervalos muito próximos. E no dia seguinte fomos uma depois da outra pra sala de cirurgia e depois pra recuperação. Lá se foi mais uma manhã e quase toda a tarde comentando o que sentimos, o que choramos.
Cinco dias de repouso, abstinência sexual, revisão e o nó na garganta. A organização que pude fazer neste período foi guardar os presentes que havia ganho, até porque cada vez que olhava pra eles o nó apertava. Fui muito amparada com palavras de amor, carinho e consolo. Várias lágrimas se juntaram as minhas e sentir isto me consolou muito. Recebi palavras de muito amor! E recebi o incentivo de não desistir, embora neste momento ainda tenha um pouco de receio, justamente por não saber porque a gravidez foi interrompida. Acolho o incentivo com carinho, as pessoas não fazem por mal, elas apenas querem que a gente solte aquela tristeza e agarre uma nova chance de felicidade.
Passaram nove dias desse procedimento. Vira e mexe me assaltam pensamentos de como seria... Mas minhas preces foram atendidas pois consegui receber com felicidade sincera a notícia da gravidez de uma amiga querida.
Sigo adiante com o coração ainda dolorido, colocando as coisas que caíram no lugar, o nó está afrouxando e muito amor tem se multiplicado. Quanto as lágrimas, creio que seja inevitável deixá-las cair, faz parte de mim chorar, seja de alegria ou tristeza! Agradeço o apoio e o carinho do meu companheiro, dos meus pais, dos meus sogros, cunhados, irmãos, tios e amigos. Agradeço aos médicos e enfermeiros que me atenderam no São Francisco. Agradeço a Deus e a espiritualidade a oportunidade de sentir esta felicidade, mesmo tendo sido interrompida, também agradeço o aprendizado.