sexta-feira, 12 de abril de 2013

O luto ao invés de despedida pensemos num "até breve"

O luto mais antigo na família da minha mãe que tenho na minha memória é do meu priminho Marcio que faleceu praticamente bebê. Eu devia ter uns cinco, seis anos, talvez quatro, não lembro bem. Mas lembro com nitidez dos dias anteriores a morte dele e a comoção de toda a família por aquela perda prematura.
Numas noites antes da partida dele estávamos na casa da tia Ieda, mãe dele, e ele já estava meio ruinzinho. No colo da irmã mais velha, Adriane, a tia Semita o examinou dizendo que ele estava com caxumba. Os mais velhos riram do diagnóstico dela. Eu era criança não sabia do que se tratava, mas pelo tom grave e apavorado da voz da minha tia imaginei tratar-se de doença séria.
Na minha cabeça, na minha lembrança confusa, no outro dia a tia Ieda o levou para o hospital e algumas horas depois ele morreu. São lembranças muito vivas da tristeza da minha tia quando desceu do carro trazendo a notícia de que o Márcio tinha ido embora. Lembro de estar na cozinha da casa da vó Mália vendo todos os adultos e até as crianças chorando e eu sofrendo duramente, sentindo-me uma insensível por não conseguir chorar. Encolhi-me debaixo de uma mesa e fiquei ali, escutando a "falaiada" de todos, escutando seus choros e lamentos. Então minha mãe me puxou e começou a conversar comigo e recordo que contei que não conseguia chorar pelo Márcio, mas que queria, que me sentia culpada por não chorar. Ela me acalmou e disse que eu não ficasse me recriminando, que ele entendia. Foi neste momento que chorei. Ele era tão pequenininho, tão bebê e conseguia compreender e sentir claramente o amor que cada um de nós dedicava a ele.
A partida da minha tia avó Edith e depois da minha bisa Elmiria foi bem difícil também. Nesta época eu era um pouco maior. Como minha tia já estava doente há algum tempo e minha bisa faleceu com 96 anos o choque da partida parece ser mais ameno. Mas a dor é grande da mesma forma, apenas a forma de racionalizar a perda é que muda, afinal elas haviam estado bastante tempo conosco.
Baque grande foi quando minha prima Márcia foi embora. Ela tinha diabetes desde criança e foi embora moça com pouco mais de 15 anos. Outra vez ia s'embora  alguém que tinha muito tempo pela frente. Que amávamos tanto e que, pra nós tinha muito o que viver. Estudando a Doutrina Espírita vamos percebendo que estas situações são necessárias para o nosso aprendizado e crescimento enquanto espíritos. Mas na nossa carne, na pele de uma mãe a partida de um filho é coisa muito difícil de compreender e não há argumentos que façam mudar a forma como se esta sentindo naquele momento.
Na família do meu pai o luto mais antigo e mais duradouro foi a morte do meu primo Laudemir. Ele morreu com 17, 18 anos num retiro espiritual na época do carnaval. Eu tinha 3 anos na época e tinha uma ligação muito forte com ele que adorava crianças. Ele se afogou para salvar uma outra pessoa, mas ninguém teve coragem de socorre-lo já que o pastor havia dito que "se Deus quisesse ele se salvaria". Minha lembrança é bem nítida a este respeito, mesmo sendo tão pequena. Lembro do meu pai indo com meu tio buscar o corpo dele. E lembro até de um sonho com o lugar aonde eu via o corpo dele sem vida próximo ao arroio onde ele se afogou. Tenho certeza de que o sonho é fruto da minha imaginação a partir das coisas que eu escutava os adultos comentando. Minha tia Marli ficou muitos e muitos anos com aquela dor lancinante no peito. Sentindo culpa por crer que poderia ter evitado tudo aquilo, sofrendo com a saudade, sofrendo pelo que não poderia ver do futuro dele que foi embora tão brusca e prematuramente. Todos nós olhávamos a dor dela e pensávamos que ela não iria nunca se recuperar. Anos depois seu outro filho morreu num acidente. O baque foi ainda maior e nossa impressão era que agora sim, não teria como sair daquela profunda tristeza.
Mas o tempo, aquele senhor sábio que sempre ajuda a nossa caminhada evolutiva, foi ajudando a tia Marli. Ela começou a fazer roupinhas de bebê para dar a pessoas conhecidas ou não como forma de homenagear seu filho mais velho que partiu cedo e tanto gostava de crianças. Foi estudar a Doutrina para melhor compreender-se. A dor, a saudade, não passam nunca, diz ela e meu tio, mas a gente aprende a conviver.
Vendo o sofrimento da minha irmã, toda a dor e a revolta que ela sente agora, penso no tempo. Penso que tudo tomará seu lugar, que a compreensão virá. Rogo que venha. É claro que não tem como estimar quanto tempo. No momento é auxilia-la o quanto possível com sua dor.
O luto é um momento difícil pelo qual todos passamos de alguma forma. Na minha visão é sim, como uma viagem, como se o outro estivesse num outro país e um dia nos encontraremos. No momento da partida choramos, afinal quantos de nós não nos despedimos nas rodoviárias, aeroportos e portos com lágrimas nos olhos antevendo a saudade que vamos sentir da família e dos amigos? Mas a certeza de que nos reencontraremos nos conforta. Não digamos "adeus", vamos dizer "até breve"!

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