segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Homologações

Desde que comecei a trabalhar no escritório com meu pai, pra ajudar a pagar a faculdade, atuo no departamento pessoal. O pessoal é aquele setor de contratação de funcionários, que calcula salários, horas, impostos da folha de pagamento, férias e as temidas rescisões. Neste tempo todo, raramente ia aos sindicatos fazer as homologações, geralmente quem fazia isto era o meu pai.
Não vou falar na crise, não vou falar de política ou de direitos trabalhistas, muitos falam sobre isto sempre. É importante, talvez algum dia eu venha falar disto, mas noutra ocasião. Nesta vou falar do lado humano de uma demissão.
Este ano pessoas queridas com muitos anos de trabalho na mesma empresa foram demitidos, entre eles amigas queridas, com mais de uma década de casa. Pessoas que vestiram a camiseta da empresa, que de tantos anos labutando no mesmo lugar sentiam que a firma era sua segunda casa. Todas elas foram pegas de surpresa. Em nenhum momento lhes passou pela cabeça que seus patrões estivessem insatisfeitos com seu trabalho, jamais lhes reclamaram atrasos ou faltas e nunca disseram que faltou fazer isto ou aquilo. Exatamente por isto o aviso prévio foi um choque! Ser demitido quando não se espera é como se o chão fosse tirado debaixo dos nossos pés, se pensa nas contas, na família, no final do mês, se pensa pra onde vou agora, o que farei se meu cotidiano era da casa pro trabalho, do trabalho pra casa? A gente costuma pensar que pertence a um lugar, principalmente quando ele faz parte do nosso dia-a-dia. E também pensa que aquele lugar nos pertence, afinal de contas 18 ou 20 anos de trabalho na mesma empresa não são 20 dias, é uma vida! Conhecemos a família do chefe e o chefe a nossa. Sabemos o quanto foi duro e o quanto ele progrediu e investiu na empresa, no crescimento econômico do setor e até no crescimento da cidade onde está o empreendimento. Temos até orgulho de dizer que somos funcionários daquela pessoa que começou a empresa numa saleta dividida com outros colegas e que hoje tem mais de cem funcionários. É como aquele primo ou amigo de infância que se forma médico depois de tanto esforço.
Agora, na hora de assinar o aviso, de se preparar para receber a demissão e seguir outro caminho é inevitável deixar de pensar "de que valeu"? Eu sempre sou de acreditar que tudo vale a pena! Mas é difícil viver este luto, compreender que talvez, realmente não tenha sido algo pessoal. Avaliamos o quanto de dedicação investimos naquele cotidiano, o quanto esperávamos, o quanto gostávamos, porque tem muita gente que trabalha com amor e satisfação. E pra mim é extremamente duro ir fazer a homologação da rescisão e ver os olhos daquelas pessoas me interrogando "porque?". Na grande maioria das vezes eu não faço ideia do motivo da demissão. Também muitas vezes fico tão chocada com o anuncio da demissão quanto quem recebeu!
Nestes últimos dias achei bem difícil fazer as homologações e fiquei consternada com a dor dos ex-funcionários. Foi uma delas que me falou que precisamos estar conscientes de que não pertencemos a lugar nenhum, mesmo que doa muito falar sobre isto e que nas primeiras semanas tenha sido quase impossível falar ou lembrar do ocorrido sem chorar.

Um comentário:

Unknown disse...

É verdade, também fiquei chocada com alguns casos mas só nos resta oferecer consolo aos amigos.